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Intragressividade
e Depressão
Por: Luís Vasconcellos
Temos que ter uma agressividade natural, que é o que, em
nós mesmos, dá suporte instintivo para a originalidade, a ousadia, a
disposição positiva diante dos desafios e assim por diante. Sem
agressividade o EU não tem desejos e não luta para realizá-los...
Quem se encontra destituído (podado/proibido/surrupiado) de uma DOSE
NATURAL de AGRESSIVIDADE, NECESSÁRIA a uma VIDA SAUDÁVEL e FELIZ, acaba
negociando mal as inúmeras situações da vida prática e amorosa,
especialmente aquelas em que a defesa do Eu e dos valores do EU é
necessária ou mesmo imprescindível.
A agressividade reprimida é UMA das causas da depressão...
Ainda hoje respondi a e-mails cujo tema principal é a dificuldade que as
pessoas têm para elaborar sentimentos negativos e impulsos agressivos.
A grosso modo podemos dizer que as pessoas se diferenciam entre as que são
INTRAGRESSIVAS e as que são EXTRAGRESSIVAS, com possíveis graduações
infinitas entre as modalidades ATIVA e PASSIVA.
No extremo da extragressividade temos os tipos violentos/revoltados que
não hesitam em atacar e ferir...
No extremo oposto temos os inibidos/conformados e que sofrem quietos sem
jamais agir agressivamente contra quem quer que seja, por melhor que seja
o motivo e mesmo que isto seja justo...
Obs.: Para efeito desta reflexão em particular não vou comentar todos
os caminhos da energia vital, que podem ser muitos, talvez infinitos, mas
vou me ater APENAS ao modo específico como ela se apresenta no âmbito do
funcionamento do EU INTRAGRESSIVO.
Faço votos de que NINGUÉM (!!!) entenda que só é possível a felicidade
humana ATRAVÉS de uma perspectiva extragressiva... Tudo tem a sua hora e o
equilíbrio/paz/alegria são atingidos pelo EU que se faça capaz de AMBAS as
atitudes, dependendo da pessoa, da situação, da hora e do lugar...
Uma pessoa que tenha uma agressividade bem colocada, não fica na
dependência do OUTRO autorizar ou concordar com suas ações e decisões.
Claro que é muito bom quando encontramos espaço, na
relação, para exercer nossas individualidades e vontades pessoais.
Contudo, não podemos fantasiar que estejamos vivendo este ideal na vida
prática, pois ele tem que ser conquistado e dificilmente vem assim sem
esforço e aprendizado individual...
Não podemos agir espontaneamente se a nossa primeira
preocupação é a de agradar o OUTRO.
E, se alguém negocia mal os “confrontos de interesses” então o resultado é
a frustração pessoal (a falta de individualidade!) e instala-se também o
mau costume de fazer do OUTRO a “desculpa preferida” para
explicar/justificar a frustração, tédio ou falta de ânimo individual.
Já que somos seres que possuem desejos e interesses
pessoais, então, não pode nem deve ser transferida ao OUTRO a
responsabilidade INDIVIDUAL de agir em busca do prazer e da realização
pessoal.
O EU lNTRAGRESSIVO se esquece de que o OUTRO não tem obrigação de
concordar nem de facilitar a sua realização pessoal. Se esta facilitação
ocorre é ótimo, e podemos falar de AMOR/cooperação e, se não ocorre,
podemos contar com o fato de que algum vínculo de PODER ou de dominação
(de um pelo outro) esteja sendo a principal preocupação. Não é incomum
que, com o tempo, os “tipos” se acomodem em uma relação de “jogo de poder”
onde acaba estabelecida a regra de que um “tudo pode” e o outro “nada
pode”.
Exatamente por acontecer esta “transferência de
responsabilidade pessoal” o OUTRO aparece, aos olhos do EU INTRAGRESSIVO,
como um obstáculo à realização dos desejos pessoais tornando-se, portanto,
a sua “desculpa preferida” [ele(a) não me deixa ser feliz!] e este estado
de coisas constitui um motivo freqüente de frustração, mágoa, brigas e
discussões... E tem gente que jura amar a pessoa que, por outro lado, é a
culpada e a responsável pela sua frustração individual!!!
Existe um ciclo de condicionamentos e de processos emocionais que aparece
embasando a atitude - geralmente trágica - do EU INTRAGRESSIVO.
Geralmente, é a agressividade reprimida que transforma
um EU em um “sofredor passivo” - um “engolidor de sapos”, como se diz - e
esta atitude do EU dificulta a negociação dos inúmeros aspectos relevantes
nos relacionamentos com os OUTROS, de todos os tipos, já que TUDO QUE
OCORRE EM UMA RELAÇÃO INTERPESSOAL SIGNIFICA, POR PRINCÍPIO, UM CONFRONTO
DE FORÇAS, MUITAS VEZES OPOSTAS, E É DESTE CONFRONTO - porém, não
obrigatoriamente um conflito - QUE SURGE UMA NEGOCIAÇÃO/ACORDO ENTRE AS
PARTES ENVOLVIDAS.
Sem uma agressividade natural ficamos submissos ao que “está posto” e
ficamos incapazes de gerar mudanças ou transformações em nossas vidas. Sem
um objetivo ou uma meta verdadeiramente nossa ficamos sem uma referência
individual e, assim desorientados, acabamos sem uma ESTRATÉGIA PESSOAL
diante dos desafios e dificuldades da vida.
De modo que, se tomarmos – em nosso código de valores
internalizado, a agressividade como algo negativo e censurável, ALGO MUITO
COMUM EM UMA SOCIEDADE DE MASSAS COMO A NOSSA - sofreremos um prejuízo
considerável em nossas próprias vidas, já que parcelas vitais da vida
serão afastadas de nossas considerações pessoais.
Um processo muito importante de se entender refere-se aos sentimentos
negativos como raiva, mágoa, orgulho ferido e outros assemelhados que se
instalam na medida em que a nossa agressividade tenha sido estimulada por
pessoas ou circunstâncias imprevisíveis, frustrando-nos, de algum modo.
Tomemos como exemplo o fato de um EU ter se sentido desrespeitado pelo
companheiro e entender que tinha razão - assim como o fato do EU em
questão não ter defendido seus pontos de vista a contento e acabar sendo
“vencido” na briga/discussão/negociação.
Ora, a energia vital que tenha sido mobilizada em
direção à realização pessoal, esbarra e é contida pelo OUTRO e, por conta
da repressão e censura da agressividade natural, permanece embutida e sem
saída... Pois bem, esta energia irá se transformar em um primeiro momento
no conhecido sentimento de mágoa (a raiva pelo que o OUTRO fez - como
obstáculo ao meu prazer e crescimento - se transforma em mágoa contra
ele). O Eu construtor da mágoa encontra então o culpado por isto: o OUTRO
e passa a nutrir - silenciosamente, em um primeiro momento - raiva/mágoa
dirigida ao OUTRO.
Mas, a energia de mágoa - se continuamos passivos e sem
agir de acordo com os nossos mais válidos e justos impulsos agressivos -
tem que ir para algum lugar, de preferência, claro, em direção àquele que
a motivou/originou: o OUTRO. Então, surge o desejo de vingança e a
necessidade da retaliação – palavra derivada do exercício da lei de
Talião: “olho por olho dente por dente”.
Mas pode ser que a retaliação não ocorra no futuro próximo e então a mágoa
– originalmente contra o OUTRO - começa a sofrer uma transformação e se
apresenta assim pelos seguintes fatos:
- O EU não ter dito o que queria dizer.
- O EU não feito o que quis fazer naquela situação.
- O EU ter sido, como sempre, o bonzinho, aquele que não dá vexame, não
briga, não grita nem esperneia... Infelizmente, este bonzinho também é o
mesmo que “engole sapos”, um atrás do outro, como quem não se respeita e
não se valoriza...
Enfim, um EU que não sabe negociar as situações de discussão, briga,
disputa e competição...
Então, se é que já notaram, o EU ficou primeiro com raiva do OUTRO, depois
magoado com o OUTRO e, finalmente, começou a magoar-se consigo mesmo, pois
a energia que tinha a direção do OUTRO não teve como sair e agora ela SE
TRANSFORMOU em uma mágoa e uma agressividade voltada contra o próprio EU.
Este estado de coisas acaba gerando um sentimento negativo de desvalia e
de auto-recriminação. Neste contexto a auto-estima vai se rebaixar e o EU
se sentirá vencido e derrotado...
Neste estágio o EU já se encontra “desistindo” de atingir o OUTRO com o
que quer que seja, mesmo porque, decerto, o OUTRO já nem lembra mais o por
quê do EU estar magoado com ele. Como se não bastasse isto, que já é, em
si, bastante desagradável, o EU se lembra agora - neste estágio do
processo e para seu próprio desespero - que o OUTRO vai repetir, a
qualquer momento, a atitude ou comportamento que ORIGINOU A MÁGOA... E
isto ocorrerá inapelavelmente pelo fato de que o EU não foi capaz de
estabelecer um limite para o OUTRO, de fazê-lo entender claramente que o
OUTRO não pode fazer isto, não deste jeito e agora, o OUTRO, sem dúvida
poderá a qualquer momento magoar o EU de novo, que sentirá toda aquela
mesma raiva novamente...
Isto deixa o EU “com um pé atrás” e o Administrador da Dor – que reside em
cada um - vai cuidar diligentemente, dali por diante, para que isto não se
repita e, ao menor sinal de que isto se repetirá o EU vai fugir da briga e
tentar controlar a situação de outro modo, dando um jeitinho qualquer para
evitar o confronto.
(sugere-se, para melhor compreensão deste processo a leitura de meus
artigos a respeito do “Administrador da Dor”).
... Continuando... Este EU sem agressividade natural vai pensar: ....
“Aliás, a melhor maneira é concordar com tudo (brigar e discutir não leva
mesmo a nada!!!). Taí! Pronto! Nem haverá briga e todos ficaremos em paz.
É horrível fazer isto, pois demonstra o quanto o EU é covarde e sem
respeito por si mesmo!
Minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa...
Mas, é preferível isto a ter que brigar e discutir a toda hora e forçar o
OUTRO ao que quer que seja... O EU não tem o direito de obrigar ninguém a
fazer o que não quiser fazer, mesmo porque o EU odeia quando se vê forçado
deste jeito e é o que mais acontece... O EU odeia quando o colocam nesta
situação... É! o jeito é o EU se calar e agüentar tudo que vier pela
frente...”
Assim se dá o ciclo - processo - pelo qual passa a energia agressiva
reprimida. Este ciclo - com infinitas gradações - vai do impulso que:
- leva à ação = extragressivo e/ou
- não leva à ação = intragressivo - o que enseja a autoflagelação, a
autocomiseração e a auto-indulgência (sentir pena de si mesmo!).
Este não é um processo imutável ou fixo e podemos mudar suas
características sempre que despertamos a consciência individual e agirmos
de acordo para mudá-la.
O mais importante de tudo é aprender a corrigir a posição de “inércia
trágica” e tomar decisões, fazer escolhas e manter-se concentrado em um
objetivo libertador, qual seja, o de sair do ciclo, modificando o seu
desenrolar e as suas já sabidas conseqüências danosas.
Esta é uma das funções de uma terapia de apoio: restabelecer os
equilíbrios naturais na pessoa e torná-la apta a fazer uso apropriado e
sadio dos recursos que a natureza lhe deu.
Uma das “medidas úteis” que o EU pode tomar é a de aprender a NÃO ENCHER o
“coração” de mágoa; ou seja, se tiver de dizer algo pra alguém, diga-o; se
tiver de fazer alguma coisa em relação a um problema, faça-o; se não ficou
satisfeito com o que falou ou com o que disse (ontem?) para alguém, volte
lá e melhore a qualidade da sua expressão pessoal;
Ou seja, você precisa aprender a FAZER coisas que agradem a v. mesmo,
ficando mais feliz com o que conseguir a partir disto: a partir do fato de
ter tentado, ter agido, ter arriscado, ter se projetado na situação de
modo individual e pessoal.
Se, nestas circunstâncias, algo não der certo v. terá - ao menos - o
consolo de TER AGIDO... E PODERÁ DIZER: eu me movi na direção de ser
feliz, agi para realizar/atingir o meu desejo, procurei ser eu mesmo...
Deste modo, a “mágoa voltada contra si mesmo” não mais existirá: sairá de
sua vida.
O segundo fator a ser modificado é aprender a negociar “contratos” com os
outros, ou seja, dar a si mesmo o direito de ser feliz, experimentar
pequenas e grandes vitórias, dar a si mesmo o direito de ficar satisfeito
com o resultado das negociações com os outros e sair (das situações)
contente com os resultados obtidos.
Todos sabemos que em uma “boa negociação” todas as partes encontram sua
parcela de satisfação...
Portanto, nas relações humanas, em geral, ficamos mais felizes quando nos
convencemos que (provavelmente!) ninguém pode saber, melhor do que nós
mesmos, o que nos serve ou aquilo que nos fará felizes; do mesmo modo
ninguém pode fazer por mim o que EU tiver de fazer por mim. Ninguém
(provavelmente!) irá proporcionar o que o EU de fato deseja, a menos que o
EU mostre claramente o que deseja e aja de acordo, para atingir a
realização disto.
Neste sentido nós não temos que ser bonzinhos, certinhos e bem comportados
e, sim, aprender a lutar o “bom combate.” Ou seja, temos que nutrir e
despertar uma agressividade natural... Na medida certa, nem pouco nem
demais...
Um EU autêntico costuma desenvolver qualidades naturais como a doçura e a
delicadeza, a elegância e o equilíbrio, pois sua força só é usada, e bem
dosada, quando necessária e na dose certa para que o EU, no mínimo, evite
“engolir sapos” e saia das situações frustrado consigo mesmo...
Uma agressividade natural e bem colocada também cria (ou enseja) a
possibilidade da compaixão e da misericórdia... Um EU que se encontre
sempre magoado não conhece a experiência da compreensão nem a do perdão.
Um EU autêntico vive no AGORA, vive no momento presente, que é o momento e
o tempo no qual alguma coisa tem que ser decidida, algum desfecho terá que
ocorrer... É no AGORA que temos que tomar decisões e fazer escolhas
individuais.
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