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Ira,
Medo e Sobrevivência
Por: Maria Aparecida Diniz Bressani
Existem dois sentimentos
básicos que movem o ser humano: a Ira e o Medo. Eles têm suas raízes na
necessidade da sobrevivência.
A Ira é um sentimento que
fomenta energia e coragem de lutar pelo que se quer, e leva à exposição e
à ação.
O Medo é um sentimento que
gera senso de proteção e recolhimento. Leva a comportamentos tais como:
fugir, parar ou recuar.
São dois sentimentos necessários e importantes para a sobrevivência do ser
humano que, desde os primórdios, sempre precisou descobrir através dos
instintos o momento de lutar e o momento de recuar diante dos perigos que
a vida lhe impunha.
Partindo desses dois
sentimentos básicos, teremos dois padrões, também básicos, de
comportamento, que são a agressividade e a passividade, ou seja, o
posicionar-se ativa ou passivamente diante das situações e das pessoas.
Da agressividade à passividade existe um leque extenso de gradação, que
vai desde o caso patológico, onde a Ira aplicada num pólo extremo leva a
pessoa a passar feito “trator” sobre qualquer um, sem levar em conta
sentimentos e necessidades de ninguém - o tipo psicopata ou sociopata (e
chegando a casos mais brandos encontramos o egoísta), até o pólo extremo
onde com o Medo presente descobrimos a depressão e a síndrome de pânico e
indo mais longe ainda nesta ponta encontraremos o ser psicótico.
Quero deixar bem claro que tais sentimentos – Ira e Medo – da maneira que
descrevo, são vivenciados de forma inconsciente, pois são frutos do
próprio processo de sobrevivência do ser humano no planeta Terra.
E é claro que Ira e Medo estão dentro de todos nós atuando
concomitantemente e dentro de gradações específicas, de acordo com as
características de personalidade e valores pessoais de cada um.
A agressividade, como conseqüência da Ira, coloca-nos na linha de frente
da batalha da vida, nos colocando ativamente na direção do que queremos e
estabelecemos como meta de vida; desenvolvendo a coragem como traço
predominante de personalidade, lutando ou contornando os obstáculos que a
vida se nos apresenta para atingir tais metas.
Com a passividade, como produto do Medo, batemos em retirada, até mesmo
desertamos da “guerra”; há um “quê” de desistência da vida e dos direitos
que lhe dizem respeito enquanto ser humano.
A Ira tem seu lado negativo e
seu lado positivo.
O lado negativo da Ira é a
destrutividade. É a agressividade utilizada com fins destrutivos. É a
capacidade de destruir o objeto, pessoa ou situação “sentida” como
ameaçadora. Não se levam em consideração os sentimentos e necessidades de
ninguém e, por incrível que pareça, às vezes, nem os próprios sentimentos,
pois seu pensamento e ação estão dirigidos para seu foco que é “ganhar”,
ou seja, sobreviver a qualquer custo. Neste lado não se cogitam questões
que envolvam sentimentos e emoções: é puro instinto de sobrevivência.
Temos vários exemplos sobre este traço extremo da agressividade brutal na
história da humanidade, como Hitler e, mais recentemente, o presidente dos
Estados Unidos, George W. Bush.
O lado positivo da Ira é a
construtividade. É a energia dinâmica dirigida em prol de melhorar ou
aperfeiçoar algo. É a capacidade de ser assertivo e construtivo frente a
uma situação ou pessoa. Neste caso está presente o senso de consciência de
quem se é e do que se quer, com seu real direito adquirido. Mais do que
agressiva a pessoa é ativa e tem habilidade para a ação adequada dentro do
que a situação pede para a manutenção positiva da mesma. Como, por
exemplo, num relacionamento quando você atua ativamente dentro dos seus
direitos sem invadir os direitos do outro, estará usando a capacidade
agressiva de forma positiva, pois, ao se colocar na posição que é sua por
direito o outro também estará na posição que é dele por direito e então,
todos estarão em seus devidos lugares dentro da relação, promovendo,
assim, um relacionamento equilibrado e harmônico.
Da mesma forma, o medo também tem dois lado: o negativo e o positivo.
O lado negativo extremo do
Medo leva a pessoa a fugir ou se anular frente às pessoas ou situações.
Fica totalmente passiva e inerte. Vitimiza-se!
Podemos usar o mesmo exemplo
acima, sobre os direitos e deveres dentro de uma relação. Quando, por
qualquer razão, você não se coloca, não se apresenta com sua
individualidade, com o seu querer e seus direitos e deveres, haverá um
desequilíbrio onde um fica com os direitos e o outro com os deveres. Um
fica com tudo e outro com o nada. E aquele que fica com o nada sente-se um
nada, vitimizando-se. Mas é importante perceber que aquele que se colocou
como um nada está, na verdade, atuando sob o Medo e está será a
conseqüência natural.
O lado positivo do medo é aquela “luzinha” que de vez em quando acende
dentro de nós nos dando o alerta de “perigo” pelo caminho que estamos
seguindo, levando-nos a recuar ou desviar estrategicamente do “perigo”.
Eu nem chamaria este lado positivo do medo de “medo”; eu diria que é viver
consciente de que a vida está sempre nos apresentando situações que podem
exigir que nos defendamos ou recuemos estrategicamente, pois não ter esta
“luzinha” de alerta é como nos colocar numa posição de vulnerabilidade
diante das situações e pessoas em nossa vida.
Por isto é tão importante a autoconsciência, pois teremos esta “luzinha”
de alerta dentro de nós sempre em funcionamento e saberemos quando agir e
quando recuar.
É importante saber que a vida é feita de momentos: momento de agir e
momento de esperar; que a vida é feita de escolhas, sejam elas feitas de
forma passiva ou ativa - o que também é uma escolha.
Como aquele brinquedo infantil, a gangorra, tem duas pontas – você e o
outro (ou uma situação) – e um eixo. Aquele que está embaixo precisa agir,
impulsionando-se para cima, e aquele que está em cima tem que esperar que
aquele que está embaixo aja para que, no momento adequado, também possa
agir e, assim, dinamizar a brincadeira. O eixo do brinquedo é o ponto onde
há o equilíbrio para o subir e o descer, e ao mesmo tempo o dinamiza.
Nunca devemos nos esquecer que, como a gangorra, com seu sobe e desce, a
vida é dinâmica, exigindo-nos comportamentos de atividade e passividade;
também como na gangorra que tem um eixo mantendo a dinâmica da brincadeira
no sobe e desce, nós também temos um eixo e esse eixo, na nossa própria
vida, somos nós mesmos.
Esta é a dinâmica da vida: atividade e passividade. Comportamentos
interdependentes presentes o tempo todo num ritmo continuo da própria
vida, mas que tem um suporte: o nosso Eu.
Nós “herdamos” de nossos ancestrais a necessidade da sobrevivência, e é o
desenvolvimento da autoconsciência que dará o equilíbrio necessário –
centrados no nosso eixo – para não pendermos nem para a Ira destrutiva (ou
autodestrutiva) nem para o Medo paralisante e sim, para que possamos usar,
conscientemente, os pólos positivos da Ira e do Medo e desta forma
estabelecer com a nossa própria vida uma “brincadeira” amorosa, harmoniosa
e divertida.
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