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Por: Bel Cesar
Com a vinda de Sua Santidade Dalai Lama ao Brasil, tenho visto um crescente
interesse dos jornalistas brasileiros sobre a relação entre o Budismo e a
Ciência. Por isso, selecionei mais um texto do livro Autocura Tântrica III
(Ed.Gaia) de Lama Gangchen Rinpoche, para que vocês, leitores do
Somostodosum, pudessem também conhecer um pouco mais sobre este assunto!
BUDISMO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA, O NOVO VEÍCULO DE SABEDORIA
Todos os fenômenos dos mundos externo e interno, com exceção do espaço natural e
da vacuidade, existem na impermanência. Das maiores cadeias de montanhas,
estrelas e galáxias à corrente interna de energia de vida dos seres humanos com
suas emoções e pensamentos sempre em mutação, tudo está continuamente se
desintegrando momento a momento e se transformando em outra manifestação de vida
e de energia elemental.
A dança cósmica da criação, transformação e destruição, nos níveis grosseiro,
sutil e muito sutil, segue o ritmo cósmico fundamental e a melodia do karma, da
vacuidade e do surgimento interdependente dos fenômenos.
Em minha opinião, os iogues tântricos antigos e modernos, os mahasiddhas,
santos, filósofos tibetanos (gueshes) e outros Seres Sagrados que pesquisam o
mundo interior e os físicos que investigam o mundo externo, independentemente
uns dos outros, descobriram a verdade da vacuidade e da interdependência dos
fenômenos. É claro que, da perspectiva budista, tudo isso é criado pela mente.
Acreditamos que a investigação científica interna da mente sutil e da energia,
realizada por muitas gerações de iogues, santos e grandes meditadores, é muito
mais profunda e poderosa que a investigação científica do nível grosseiro,
realizada por nossa geração atual. Entretanto, ambos parecem estar tocando a
mesma realidade a partir de ângulos diferentes e em diferentes níveis. Os
cientistas estão tocando a vacuidade e o surgimento interdependente dos
fenômenos do ponto de vista objetivo, no nível grosseiro, baseados nos objetos
manifestos e no que pode ser registrado pelas máquinas e conceitualmente
formulado pela matemática. Os mahasiddhas e grandes meditadores tocam a
vacuidade diretamente, subjetivamente e sem conceitos, nos níveis sutil e muito
sutil, baseados em sua experiência pessoal da dissolução de seus elementos,
ventos e consciência; resultado do terem aprendido a cuidar de seus canais,
ventos e gotas. Ambos estão tocando a vacuidade e o surgimento interdependente
dos fenômenos utilizando as estruturas de suas próprias metodologias
científicas.
Os iogues budistas afirmam o seguinte:
• Os fenômenos físicos e mentais são vazios de existência em si mesmos, pois
todos os fenômenos são projeções de nossa mente nos níveis grosseiro, sutil e
muito sutil, e o criador supremo do universo fenomênico é nossa mente muito
sutil de clara luz.
• Todos os fenômenos se manifestam interdependentemente e funcionam devido ao
karma (a lei de causa e efeito). Podemos examinar níveis diferentes de
surgimento interdependente dos fenômenos, desde o mais grosseiro (as coisas
dependem de suas partes, causas e condições) até a interdependência no nível
muito sutil, quando percebemos que nosso rotular mental dos fenômenos é o
verdadeiro ato de criação que os traz à realidade.
• O macrocosmo é um reflexo do microcosmo e vice-versa.
Conforme posso entender, as idéias defendidas pelos cientistas são as seguintes:
• Nenhum fenômeno do mundo material existe de forma concreta substancial ou
independente como normalmente aparenta. Verificando o interior dos átomos, não
encontramos nada além de espaço e energia em movimento.
• Todos os fenômenos materiais estão se desintegrando e se transformando momento
a momento, no nível sutil, de acordo com uma precisa lei de conservação da
energia, segundo a qual a energia nunca pode ser perdida no universo e, assim,
se transforma continuamente em novas formas.
• Todos os fenômenos do macrocosmo e do microcosmo são uma grande rede
interdependente. O macrocosmo reflete-se no microcosmo tal como os campos
eletromagnéticos de nossos corpos.
• Alguns pesquisadores da física quântica afirmam que o universo material não
pode ser entendido sem uma referência à consciência humana e que, de alguma
forma, a mente está ajudando a criar os fenômenos materiais.
Em minha opinião, a visão dos iogues budistas está muito próxima da visão dos
físicos de hoje. Talvez suas explicações sejam exatamente as mesmas, ou talvez,
muito pouco diferentes. Mesmo não podendo ter certeza sobre isso, não há como
negar que os físicos de hoje podem virtualmente concordar com a visão budista da
realidade. Por isso, muitos cientistas estão começando a se interessar por
aspectos específicos do budismo tibetano, e também por outras tradições
espirituais antigas, como o hinduísmo e o taoísmo.
Os cientistas estão iniciando um diálogo com os iogues budistas porque o budismo
pesquisou por completo a relação mente-matéria, os níveis sutil e muito sutil de
consciência e os cinco elementos. Se os cientistas tivessem acesso a esse nível
sutil subjetivo e objetivo da realidade, não precisariam comunicar-se com os
Lamas. Isso não significa que os cientistas precisam tornar-se budistas. Os
Lamas modernos como eu desejam apenas oferecer a essência da prática e da
filosofia Prajnaparamita, Pramana, Abhidharmakosha, do Tantra e outros métodos
aos cientistas, para que eles os utilizem como lhes parecer mais adequado.
Sua Santidade o Dalai Lama está pedindo à geração atual de Lamas que mostrem a
qualidade da investigação budista ao mundo. Hoje em dia, quase tudo já foi
examinado e pesquisado. As únicas coisas interessantes que ainda não foram
pesquisadas por completo são as mensagens das antigas culturas de sabedoria,
como o budismo tibetano. Precisamos fazer uma ponte entre a maravilhosa pesquisa
dos cientistas modernos e a maravilhosa investigação dos lamas, iogues e
mahasiddhas. Eu gostaria de organizar uma série de conferências sobre isso e
publicar os resultados para poder apresentar com clareza as boas novas dos
cientistas e iogues ao mundo.
Não é necessário que os cientistas entendam tudo sobre o budismo ou que os
budistas entendam tudo sobre a ciência. Precisamos apenas explorar conjuntamente
as áreas de interesse comum e fazer uma ponte, iniciar o diálogo e a
comunicação. Essa troca é muito importante, pois neste século todos nós
estaremos ligados à ciência ou à tecnologia, mas ainda estaremos procurando
respostas profundas para o “sentido da vida e da realidade”.
É natural que os cientistas, em seu trabalho de investigação da realidade, usem
seus termos científicos próprios para explicar suas descobertas. Mesmo não
conhecendo o significado de algumas destas palavras, é possível ter algum
sentimento sobre as verdades que eles estão tentando revelar.
Precisamos sentir e entender que essas duas correntes de visão e resultados
experimentais possuem a capacidade de desvelar algo da natureza fundamental do
universo. Embora os cientistas do mundo interno e externo se expressem de formas
diferentes, sinto que existe certamente uma relação entre suas visões de mundo
e, se fosse possível sintetizá-las, isso seria de grande benefício para a
sociedade, tanto em termos do desenvolvimento da ciência e da tecnologia, quanto
para o desenvolvimento da paz interior e da paz no mundo.Bel Cesar
é psicóloga e pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo
Tibetano.Trabalha com a técnica de EMDR, um método de Dessensibilização e
Reprocessamento através de Movimentos Oculares em São Paulo, SP. Autora dos
livros Viagem Interior ao Tibete, Morrer não se improvisa,
O livro das Emoções e
Mania de sofrer pela editora Gaia.
Email:
belcesar@ajato.com.br |
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