A Sociedade Brasileira de
Filósofos Católicos tem por meta uma filosofia que revele “o homem
brasileiro dentro de sua realidade”.1
A Dimensão Vertical
Metafísico-Ética conduz então à observação acurada, profunda do problema da
afirmação de Deus na sociedade nacional diante do fenômeno do ateísmo no
mundo de hoje.
O humanismo cristão é uma das
vias importantes, sobretudo no Brasil, que poderá obviar a atual onda do
ateísmo.
O ateísmo contemporâneo
Numa rápida síntese
verifica-se que o ateísmo contemporâneo nos países evoluídos de civilização
cristã se distingue do ateísmo de outros tempos e de outras civilizações,
mormente, por sua amplitude.
Na antigüidade, Demócrito,
Epicuro, Lucrécio divulgavam já os princípios do materialismo ateu. O poeta
e filósofo Diágoras foi obrigado, por causa de sua impiedade, a fugir de
Atenas. Cícero refere-nos que Protágoras de Abdero teve que sair também de
Atenas porque ensinava em suas obras que Deus não existe, tendo, por isto,
seus livros queimados em público.2
Raríssimo na Idade Média, o
ateísmo tornou-se mais freqüente desde o século XVI. Combatido por
Descartes, recomeçou depois. Propagado então por escritores, poetas,
cientistas e políticos eivados de ceticismo, de materialismo ou de
idealismo, diversifica-se daquele que ocorrera antes por atingir nos mais
diversos países uma escala digna de nota.
Não mais o fato de alguns
indivíduos em ruptura com a estrutura social, nem o privilégio de uma
minoria, como no século XVIII, que se julgava particularmente esclarecida. É
uma parte notável de nossos contemporâneos que adere ao ateísmo que tende a
se fazer norma aceitável por toda a parte. Intelectuais, massa operária,
camponeses mostram, em índice mais elevado que outrora, uma atitude que se
torna comum. Esta situação, constatada sobretudo na Europa, tem reflexos no
Brasil.
A realidade brasileira
Uma análise global leva a
esta assertiva: a crença em Deus não é colocada em dúvida pela maioria
absoluta do povo, mesmo levando-se em consideração a classe culta. Crê-se em
um Criador do mundo e na imortalidade da alma. A revelação contida na Bíblia
fala ainda mais alto do que as provas filosóficas. Acredita-se, porém,
mormente por tradição religiosa. Pergunta-se, porém: esta fé em Deus é
bastante forte, bem fundamentada se sustentar perante a investida
materialista de hoje?
Os meios de comunicação,
através de artigos científicos ou insinuações, direta ou indiretamente, vão
lançando a semente da descrença.
Expressões tendenciosas, por
exemplo, “Deus é a explicação do inexplicável”, trazem em si a rejeição do
Criador, o Qual vai se ofuscando à medida que a ciência explica fatos, antes
imputados a forças sobrenaturais.
Além disto, a figura de Deus
é, de fato, muitas vezes, deturpada, falsificada, e, como tal, não resiste
a uma análise de espíritos críticos.
Deus não é evidente
A tese impõe-se óbvia: o
ateísmo, que é uma possibilidade da mente humana, se torna hoje um perigo
iminente. Se Deus não é evidente nem para a razão retamente conduzida, nem
para a fé a mais sábia e a mais santa, compreende-se melhor que o ateísmo
seja uma disposição permanente para o homem, ligado aos limites próprios de
sua contingência. O ateísmo faz parte das aparências que Deus parece ter
colocado contra Ele no universo. Deus não é para o espírito humano uma
verdade patente, mas problema doloroso que exige, para ser resolvido,
reflexão, exercício, paciência, labor. O utrum Deus sit é uma árdua,
dura e trabalhosa perquirição para a inteligência. A fé soluciona tais
inquirições, mas não pode nunca estar alicerçada em quimeras.
É preciso, pois, uma base
sólida, para que destes valores que são a aceitação de Deus e o senso
religioso se passe não para a descrença, mas para a crença autêntica, bem
fundamentada em argumentos sérios.
A verdadeira concepção do
Ens a se é sempre atraente para o homem sincero e isto deve ser
explorado com sabedoria, oferecendo argumentos adequados que satisfaçam à
inteligência.
Característica do ateísmo contemporâneo
Convém notar que o ateísmo
contemporâneo quer ser um humanismo.
Há um leit motiv
comum: os ateus de hoje procuram na negação de Deus uma afirmação total do
homem.
Baseiam-se no enganoso
pressuposto de que crer em Deus é inversamente desumanizar o ser racional. É
a fórmula de todas as modalidades de ateísmo hodiernos. Eles querem oferecer
a salvação do homem pelo homem e para o homem. O ser racional almeja se
tornar para si mesmo o ser supremo. É ele a medida das ciências e da moral.
Elimina Deus para entrar na posse de sua personalidade. O culto a Deus é
desterrado a favor da idolatria do ente humano. A sabedoria deste substitui,
orgulhosamente, a fé divina. O jovem universitário brasileiro, mesmo sem ter
lido existencialistas ateus, ostenta-se identificado com as doutrinas de
Sartre, de Camus e de outros autores, em suas assertivas antiteístas. Ante a
morte, as catástrofes, a angústia, a culpa, os cataclimos, o erro, a dor e
o pecado, há uma espécie de revolta latente, que aflora, às vezes, sob
termos violentos. Surgem à tona expressões que condenam o destino trágico do
homem, cujo futuro, dizem, é incerto, o qual ele vai construindo na
perplexidade. Existência “jetée-là” como pura eventualidade, sem
causa e fundamento racional. Percebe-se aí uma certa incoerência com o
próprio assentimento à existência de Deus e à imortalidade. Há, no fundo, um
certo ressentimento contra Deus que a explicação do pecado original não
consegue dissipar.