A concepção do universo é de suma importância para o ser
racional. Da cosmovisão depende o sentido que cada um dá ao mundo, à
própria vida. A mundividência conduz à percepção completa da essência, do
valor, do significado do cosmo e da existência humana.
Não é
possível, evidentemente, uma teleologia que impeça a angústia
existencial sem uma visão correta de tudo que circunda o ente dotado de
inteligência. São questões fundamentais que o homem deve se propor: “De
onde vim? Onde estou? Para onde vou? Que me é lícito esperar?” Não se trata
de uma percepção aparente do universo, mas, sim, de apreender a finalidade
última de tudo que existe.
Neste caso a
mundividência vai além daquilo que as ciências apresentam. Trata-se de um
posicionamento ontológico que ultrapassa o mundo sensível, visível. Penetra
o universo dos valores que dão um rumo vivencial a um ser que não está
contramurado em fronteiras terrenas. É lógico que, dentro destas
considerações, a mundividência leva irreversivelmente ao Ser Supremo.
Se existem
seres finitos, contingentes que não têm em si mesmos sua explicação, é óbvio
que deve haver um Ente Necessário, Infinito. Do não-ser nada pode vir; ora
existem seres; logo, um Ser Eterno é a Causa Eficiente de tudo quanto existe
e nele a essência coincide com a existência. Dada a ordem cósmica, as leis
que regem o macrocosmos e microcosmos mostram que este Ser é Inteligente.
Mais ainda, quando se penetra nos domínios da metafísica só se pode
concluir que este Ser é a Inteligência Suprema.
A Deus leva,
irreversivelmente, a metafísica do ser e do valor . Esta repele o ateísmo,
o panteísmo, o agnosticismo, uma vez que o Criador do universo
necessariamente é um Ser pessoal inteiramente distinto do mundo, mas que o
rege com sua Providência.
De tudo isto
se conclui que pela razão o homem pode e deve chegar uma concepção do
universo que fatalmente o conduz a uma visão tal que confere um sentido a
tudo que existe, projetando o ser racional na plena realização de si mesmo.
Embora imperfeitamente, filósofos que desconheceram a Revelação divina
chegaram a ter uma noção do projeto divino global.
A
mundividência não está fundamentada numa revelação religiosa. Para o crente
ela é sumamente útil, pois alimenta a fé. Foi a postura de Anselmo de
Cantuária intelligo ut credam, credo ut intelligam - creio
para entender e entendo para crer ou fides quaerens intellectum
- a fé procurando a inteligência. A razão pode, realmente, confirmar as
verdades da fé com argumentos prováveis, embora não demostrativos. Os dados
da fé tornam-se racionais, elucidados do ponto de vista lógico, no seu
conteúdo e no seu travamento e sistematizados de modo a poderem deduzir-se
um dos outros e, assim, serem entendidos mais profundamente. É um processo
que informa logicamente o patrimônio da fé.
Portanto, a
mundividência é de vital importância para o ser pensante. Não apenas, deste
modo, como um auxílio a uma crença esclarecida, como também, e sobretudo,
para que o indivíduo possa ter uma filosofia de vida. Quem atinge pela seu
intelecto as raízes do Ser Supremo e nele contempla a sede da Sabedoria
Infinita só pode dar rumos a sua existência e, portanto, é capaz de tudo
orientar t dentro de uma ordem tal que partureje a felicidade geral. Todas
as desordens morais são banidas e quem se insere no projeto divino é o
grande construtor de um mundo humano, justo, equilibrado, fazendo florir
aqueles valores supremos que engrandecem um ser criado à imagem e semelhança
de Deus.
Importância desta reflexão
Num contexto
histórico no qual as maiores aberrações são cometidas e, mormente, o
desrespeito à vida esta reflexão filosófica demonstra que a pior de todas as
situações humanas é ignorar o fim último de tudo. Deste modo se pode superar
a tragicidade que é imanente a todo ser finito, que é, portanto, quer
queira, quer não, ontologicamente dependente do Criador, tenha ou não
consciência disto. É esta venturosa ultrapassagem para o Infinito que
engrandece o homem.
Quando este
depara com o plano criador e adere ao mesmo só pode conhecer aquele
equilíbrio que o leva uma total beatitude existencial. Dá-se a síntese
finitude/infinitude e o homem passa a fazer de sua liberdade um trampolim
para grandes realizações. É lógico que, se tudo isto está iluminado pela fé,
a mundividência atinge sua luminosidadde máxima e então surgem os gênios da
virtude que honram a humanidade na prática das ações mais extraordinárias.
Toda tensão existencial fica inteiramente superada sobretudo naqueles que
têm uma concepção do universo conjugando filosofia e fé.
A
transcendência a que leva à cosmovisão conduz ainda à fuga da futilidade do
ser, além do finito circundante. Está afastado assim o pejo da total
arbitrariedade e superfluidade da contingência radical da existência real,
porque, quem se coloca em função do Ser Supremo, inocula em tudo uma tal
finalidade que cada ação, cada ato de pensar, cada manifestação
psico-somática ganha um significado. Não se amaldiçoa então a existência e
até os desafios se tornam taumaturgos.
É assim que
cada um pode desvelar a própria existência como algo de previamente
justificado e afirmado. Situa a vida para além da angústia, numa
auto-superação firmada em Deus. É o alargamento do coração humano que bane
as neuroses, as frustrações, as depressões, os culposos auto-enganos,
frutos de toda filosofia de vida que, desconhecendo o Criador, mata
lastimavelmente o ser criado. Nada engrandece tanto o homem como o
reconhecimento de sua dependência ontológica do Ser Supremo!.