Uma questão se levanta: Uma filosofia antiga pode ser atual?
Poder-se-ia também formular este tema desta maneira: Como uma filosofia
antiga pode ser ela atual?
Cumpre de plano esclarecer os conceitos.
Uma filosofia antiga é uma doutrina pertecendo a um passado longínquo, a
uma época pretérita.
Deixando de lado ulteriores considerações sobre o conceito de
antigüidade, neste texto nos referimos à filosofia greco-romana.
Por outro lado, a idéia de atualidade pode ser entendida de duas
maneiras: Atual como sendo o que existe no momento presente ou o que
concerne e interessa à época presente.
Afirmar que uma filosofia antiga pode ser atual é querer conciliar dois
termos incompatíveis, dado que uma filosofia antiga, a priori,
não pode ter nenhuma atualidade, pela própria definição dos vocábulos, pois
pertence a um contexto anterior.
O princípio da contradição determina que uma coisa, considerada sob o
mesmo aspecto, não pode ser e não ser ao mesmo tempo, ou seja, coisa alguma
pode ter e não ter, ao mesmo tempo, determinada propriedade.
Entretanto, pode-se pensar que uma filosofia antiga é atual desde que se
considere que o conhecimento da mesma se torna um preâmbulo indispensável
para a compreensão da filosofia e da ciência hodiernas, edificadas sobre os
fundamentos de séculos passados.
Uma filosofia antiga pode ser atual na medida em que ela se faz
necessária à compreensão da filosofia contemporânea.
Avançando o raciocínio é possível inclusive asseverar que, não apenas
sob este aspecto, é lícito falar na atualidade de uma filosofia antiga, mas
também no sentido em que uma filosofia antiga pode interessar à época
presente por fornecer meios de compreensão para os problemas recentes e, na
verdade, é verídico assegurar até que, sem tais teses anteriores, há temas
que ficariam obscuros e não teriam sido aprimorados e enriquecidos como os
conhecemos hoje.
São, portanto, indispensáveis não apenas porque tais conhecimentos,
que foram maduramente idealizados por indivíduos de extraordinária potência
intelectual, deixaram um legado permanente para o desenvolvimento do pensar
humano, mas, outrossim, como foi dito, se tornaram imprescindíveis para a
solução de problemas conaturais ao homem de todos os tempos.
Se é certo que o contexto histórico varia e não se pode negar que
existe um processo que determina o surgimento de novos elementos
socioculturais, como resultado de adaptações e modificações contínuas e
progressivas de elementos anteriores que eram mais simples; se é evidente
que técnicas, formas de organização social, crenças, costumes,
conhecimentos, mais complexos e diferenciados vão surgindo século após
século e, hoje em dia, a aceleração da história é um fenômeno inegável,
contudo, seria um manifesto equívoco arrolar, por exemplo, as obras de
Sócrates, Aristóteles e Platão como desatualizadas, devendo ser inteiramente
ignoradas, precisando ser vistas como teorias pitorescas e descabidas.
Uma “ontologia do presente” não se coadunaria com uma “ontologia do
passado” é o que dizem aqueles que, exatamente, se esquecem que proferem um
contra-senso, revelando um desconhecimento primário da própria noção do ser.
Um relativismo morboso está na base de afirmações como estas: “A noção
de verdade muda”; “As normas da verdade e da admissibilidade racional
evoluem”.
Embora o progresso do saber e da técnica sejam incontestáveis, no
entanto não se pode compreender o sentido de seus resultados e deles fazer
uma idéia justa, se não se estuda o pensamento antigo dos filósofos que já
refletiram em profundidade mormente sobre problemas metafísicos.