Mitologia Budista

Por Carlos Antonio Fragoso Guimarães

 

Diz a lenda - e lendas, assim como mitos e parábolas, resumem poética e figuradamente verdades espirituais e existenciais - que Sidarta resolve meditar sob a proteção de uma figueira, a Árvore Bodhi. Lá o demônio, que representa simbolicamente o mundo terreno das aparências sempre mutáveis que Gautama se esforçava por superar, tenta enredá-lo em dúvidas sobre o sucesso de sua tentativa de se por numa vida diferente da de seus semelhantes, ou seja, vem a dúvida sobre o sentido disso tudo que ele fazia. Sidarta logo se sai dessa tentativa de confundí-lo com a argumentação interna de que sua vida ganhou um novo sentido e novos referenciais com sua escolha, que o faziam centrar-se no aqui e agora sem se apegar a desejos que lhe causaria ansiedade. Ele tinha tudo de que precisava, como as aves do céu tinham da natureza seu sutento, e toda a beleza do mundo para sua companhia. Mas Mara, o demônio, não se deu por vencido, e, ciente do perigo que aquele sujeito representava para ele, tenta convencer Sidarta a entrar logo no Nirvana - estado de consciência além dos opostos do mundo físico - imediatamente para evitar que seus insights sobre a vida sejam passados adiante. Aí é possível que Buda tenha realmente pensado duas vezes, pois ele sabia o quanto era difícil as pessoas abandonarem seus preconceitos e apegos a um mundo resumido, por elas mesmas, a experiências sensoriais.

Tratava-se de uma escolha difícil para Sidarta: o usufruto de um domínio pessoal de um conhecimento transcendente, impossível de expor facilmente em palavras, e uma dedicação ao bem-estar geral, entre a salvação pessoal e uma árdua tentativa de partilhar o conhecimento de uma consciência mais elevada com todos os homens e mulheres. Por fim, Sidarta compreendeu que todas as pessoas eram seus irmãos e irmães, e que estavam enredaddos demais em ilusórias certezas para que conseguissem, sozinhos, uma orientação para onde deviam ir. Assim, Sidarta, o Buda, resolve passar adiante seus conhecimentos.

Quando todo o seu poder argumentativo e lógico de persuassão falham, Mara, o mundo das aparências, resolve mandar a Sidarta suas três sedutoras filhas: Desejo, Prazer e Cobiça, que apresentam-se como mulheres cheias de ardor e ávidas de dar e receber prazer, e se mostram como mulheres em diferentes idades (passado, presente e futuro). Mas Sidarta sente que atingiu um estágio em que estas coisas se apresentam como ilusórias e passageiras demais, não sendo comparáveis ao estado de consciência mais calma e de sublime beleza que havia alcançado. Buda vence todas as tentativas de Mara, e este se recolhe, à espreita de um momento mais oportuno para tentar derrotar o Buda, perseguindo-o durante toda a sua vida como uma sombra, um símbolo do extremo do mundo dos prazeres.

Sidarta transformou-se no Buda em virtude de uma profunda transformação interna, psicológica e espiritual, que alterou toda a sua perspectiva de vida. "Seu modo de encarar a questão da doença, velhice e morte mudo porque ele mudou" (Fadiman & Frager, 1986).

 

Bibliografia Sugerida

  • O Pensamento Vivo de Buda, Editora Martin Claret, São Paulo, 1985.

  • Fadiman, James & Frager, Robert. Teorias da Personalidade, Editora Harbra, São Paulo, 1986.

  • Hall & Lindzey. Teorias da Personalidade, Vol. II, Ed. E.P.U. São Paulo, 1993.

  • Shearer, A. Buda, Ed. Del Prado, Madrid/Rio de Janeiro, 1997.

  • Ikeda, Daisaku. O Buda VivoEd. Record, Rio de Janeiro, 1989.

  • Jung, Carl Gustav. O Homem e Seus Símbolos, Editora Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1991.

  • Jung, Carl Gustav. Psicologia da Religião Ocidental e Oriental, Editora Vozes, Petrópolis, 1990.

  • Kersten, Holger & Gruber, Elmar R. O Buda Jesus, Editora Best Seller, São Paulo, 1996.

  • Silva, George & Homenko, Rita. Budismo - Psicologia do autoconhecimento. Ed. Pensamento, s/d.

  • Capra, Fritjof. O Tao da Física, Ed. Cultrix, São Paulo, 1986.

  • Hesse, Hermann Sidarta, Ed. Record, Rio de Janeiro, 1988.