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Saber o que Pensar é Saber Pensar?

  Por: Luís Vasconcellos

Muitos acham que ter - ou agir - com “CONSCIÊNCIA”
é igual a guiar-se pelo CONHECIMENTO ADQUIRIDO
Esta não é bem a verdade!

O conhecimento e a informação que são “adquiridos” residem no “CAMPO CONSCIENTE” humano. Por esta razão podemos nos servir de todo o conhecimento adquirido e acumulado ao longo de nossa vida, assim como da evolução do conhecimento humano ao longo das eras já que, ao sermos educados, recebemos uma organizada versão a respeito de tudo que se desenvolveu em termos de ver e de explicar o mundo e a nós mesmos, mas só no plano mental.

As concepções políticas, ideológicas, religiosas e comportamentais nos são ensinadas desde bebezinhos e elas englobam TODOS OS ASPECTOS DA VIDA. Estes CONHECIMENTOS nos são transmitidos em uma progressão crescente de abrangência:
1 - Primeiro mãe e pai (a “família nuclear”), aos quais IMITAMOS em tudo...
2 - Mais maduros, nos abrimos para a influência dos irmãos, amiguinhos e da “família extensa”, assim como para a vizinhança (a comunidade em que nascemos). Posteriormente...
3 - Nos APROPRIAMOS dos modos específicos e historicamente determinados pelos quais a sociedade em geral explica e justifica tudo que é e faz. Nos inserimos nas instituições como “bem treinados integrantes”, cônscios daquilo que é de nós esperado.
As “autoridades de plantão” se perpetuam no poder deste modo, e assim é, desde que o mundo é mundo.

O funcionamento do CONSCIENTE é notório quando agimos baseados na fidedignidade ou na repetição COERENTE das adaptações ao passado vivido. Sua atuação e os seus resultados são previsíveis, repetitivos e a sua preocupação principal é com a segurança/manutenção da continuidade da imagem idealizada do EU, muito mais do que com a evolução psicológica.
Neste peculiar modo de funcionamento ele se identifica com alguns pontos de vista, muitos meramente adquiridos, estabelecendo partidarismos, preferências egóicas e criando mecanismos de repressão para tudo aquilo que for conotado como indesejável e feio. Sua “marca” é a negação de tudo que não é considerado “conveniente”, certo, bonito ou coerente.
Ele é construído em estreita cumplicidade com o “pensamento da época” e com os valores defendidos pelas autoridades reinantes.
Como sabemos, existem EXPLICAÇÕES CONVENIENTES para tudo que se possa imaginar.

O CONSCIENTE é uma função psicológica vital para todos nós, porém pode ser vista também como uma prisão, disfarçada pela existência de “escolhas prescritas para tudo” e que se encontra "presentificada" através das sensações repetitivas com base no passado vivido: timidez, insegurança, medo, hesitação e assim por diante.
Que ninguém me leve a mal pensando que estou fazendo uma fofoca negativa a respeito do funcionamento dele, pois não se trata disto. Não há nada de intrinsecamente errado com isto e sim com o exagero (vulgo “especialização”), disfarçado de modernidade, que se instalou no funcionamento psicológico de nossa época.
No geral, me atrevo a dizer que o maior medo do CONSCIENTE INDIVIDUAL é o da repetição de algumas experiências do passado (... que doeram, que feriram, que causaram vergonha e que trouxeram consigo a ameaça de rejeição pelo meio). Sentimos mais o medo da repetição do passado do que do que possa ocorrer no futuro ou do que possa acontecer a partir de uma exposição ao perigoso “DESCONHECIDO”. E há sem dúvida um aspecto da vida que o CONSCIENTE considera um tabu e que é evitado, por todos os meios possíveis e imagináveis: a existência de um fenômeno natural chamado MORTE. O CONSCIENTE evita aceitar, existencialmente, experiências como a FINITUDE ou a IMPERMANÊNCIA de tudo e de todos.

Continuando... A mesma lógica (de economia de energia) que está presente no hábito (que não exige atenção consciente constante), está implícita no funcionamento do CONSCIENTE (“piloto automático”), no qual a CONSCIÊNCIA está fora do limiar ideal de seu funcionamento e, portanto, quase inativa.
Quem não se sente cumprindo um programa sem quase nenhuma escolha pessoal???
O CONSCIENTE representa um campo muito vasto, assim como é o funcionamento predominante em nós, dependendo menos de esforço e de disponibilidade da finita e preciosa energia vital para trabalhar.
Quero aqui lembrar que os paradigmas e valores (de uma cultura) são historicamente determinados e que, portanto, são apenas relativos. Pessoas do passado, que se transportassem para o nosso presente diriam, sem dúvida, que enlouquecemos... Pessoas do futuro que aqui aportassem diriam arrogantemente que não sabemos muita coisa a respeito de muita coisa...

É duro constatar que sempre dependeremos das “igrejinhas de pensamento” e de sua inesgotável resistência às mudanças - que se impõem e se fazem necessárias para que haja evolução nos conceitos e idéias.
Destas “igrejinhas de pensamento” nos nutrimos, para desenvolver consciência de nós mesmos e do mundo em que vivemos!... Ou seja, a nossa única chance de “viver” em um MUNDO MELHOR E MAIS EVOLUÍDO é que os nossos ancestrais imediatos tivessem desenvolvido consciência de si mesmos e do mundo em que viveram a ponto de desmancharem os véus da ilusão e da estupidez humana, que é, até onde se pode constatar, inesgotável.
Ninguém que se encontre unipolarizado e restrito ao funcionamento CONSCIENTE abrirá seus olhos para o divino, para o religioso, para o desconhecido ou para o que, em nós, permanece ainda INCONSCIENTE...
O CONSCIENTE é aquele processo, EXTREMAMENTE MANIPULADOR, de ficar prestando atenção ou ao que se vai ganhar ou a propósitos preestabelecidos (com base na carência e na necessidade que, no passado, se tornaram prementes e que se tornaram, POR CONTA DOS TRAUMAS VIVIDOS, no foco principal da atenção).

Nasce daí a função do ADMINISTRADOR da POSSIBILIDADE da DOR e do PRAZER; vulgo “CONSCIENTE” que pensa, antecipa, prevê, analisa, explica e deduz.
Ele “ADMINISTRA A VIDA” e tenta controlar a realidade como um todo, sob o ponto de vista dos interesses, necessidades e medos pessoais, sempre com base na experiência VIVIDA de cada um e nos valores e crenças adquiridas do meio ambiente social e familiar.
O CONSCIENTE serve, portanto, ao momento civilizatório, mais do que ao homem natural, ao homem instintivo. A marca do “cyborg CONSCIENTE” é a repetição e o hábito enquanto que a CONSCIÊNCIA reflete a prontidão para tudo (o viver) e a atenção a todos os aspectos de um mundo em contínua mudança (como o mundo natural), que é o “ambiente” para o qual ela se desenvolveu (visando uma adaptação a ele).
O “cyborg CONSCIENTE”, em nós, serve ao “mundo humano” das normas e concepções mecânico/repetitivas, que estrutura socialmente uma ordem e rotina típicas do modo de viver humano e civilizatório. Este desafio – de adaptação a um mundo específico e concebido pela mente consciente de um animal em especial - não foi conhecido pela natureza antes de nós, humanos, imprimirmos esta marca ao planeta.

Todo o CONHECIMENTO acumulado, do qual nos servimos, dependeu de INDIVÍDUOS e de GRUPOS humanos que criaram, a seu tempo, alternativas válidas de adaptação e de produção de transformações neste mundo que, todos nós, encontramos pronto.
Ninguém mais dá VALOR para a “mágica HUMANA” que sempre esteve subjacente à invenção da roda, ao vôo de Santos Dumont ou à maravilha da cura de doenças antes mortíferas.

Do SONHAR humano e do esforço para a concretização do sonho, imaginação, esperança ou fantasia nasceram e nascem todas as realizações passadas, presentes ou futuras.
Estas conquistas originaram-se através da criatividade e do esforço de homens que mereceram, em vida, o termo “SAPIENS”.
No geral, falando do estado CONSCIENTE comum, o que temos que concluir é que somos uma Espécie “HOMO”............ com algumas possibilidades de tornar-se.............. “SAPIENS”.

Assim como o nosso CONSCIENTE, também a CONSCIÊNCIA, em seu funcionamento, se serve do conhecimento conscientemente acumulado, mas sua dinâmica de funcionamento não é idêntica à do CONSCIENTE: A CONSCIÊNCIA humana, ao contrário, está sempre em FORMAÇÃO, em processo contínuo de mudança e de transformação. Ela se deixa guiar pelo processo vital subjacente (Inconsciente) assim como pelo mundo exterior.
A CONSCIÊNCIA é a complexa e paradoxal noção do AGORA.
O CONSCIENTE está, com freqüência, mais precisamente (historicamente) desorientado no tempo. Ele ou está preso ao passado (predominantemente!) e sem sintonia com o presente, ou ele se encontra preso ao futuro, mas igualmente sem sintonia com o momento presente (que é sempre aquele instante no qual alguma escolha ou decisão verdadeiramente pessoal é possível).
A CONSCIÊNCIA é a orientação que se ocupa da dimensão do Espaço, mais a orientação no TEMPO, onde reside a noção de um “momento presente” (quando, por exemplo, se decidem as coisas!) que é ONDE e QUANDO se constrói a transformação da realidade vindoura (por conta das ações/decisões pessoais e insubstituíveis). Ela é um “ÓRGÃO de ORIENTAÇÃO”.
Explico o que é a “vivência no TEMPO”: Este “momento presente” um dia será passado e, portanto, os atos e as decisões tomadas (os atos valem! A presença vale! O sentido do existir vale! Não há tempo para desperdiçar!) garantem uma maior qualidade da presença individual e da responsabilidade pessoal sobre as ações.
Para a CONSCIÊNCIA, o foco está no presente, mas como uma continuidade no tempo.
Para o CONSCIENTE, a noção de continuidade no tempo é perdida em prol de uma prisão ao passado e/ou uma fixação no futuro.
Ele assume o papel de “Administrador da possibilidade de exposição pessoal à DOR” e se mostra “ligado/fixado/dependente” demais ao trânsito de relações entre o EU e o Mundo.

O CONSCIENTE é o pêndulo que oscila (quando ainda não se estabilizou em um desequilíbrio permanente e repetitivo) entre os opostos, podendo então se identificar com UM dos lados de uma questão e torna-lo pessoal (simpático) e cheio de emotividade, com uma defesa intransigente de pontos de vista estabelecidos. Sobre isto escrevi bastante no texto Identidades parciais do Ego - 3/8/2000 18:00:23 aqui mesmo no SOMOSTODOSUM.
A CONSCIÊNCIA, neste sentido, é mais bem o eixo que pode VER a oscilação do pêndulo de um ponto de vista mais eqüidistante e impessoal. Ela reside em uma dimensão que está entre o EGO (CONSCIENTE) e o INCONSCIENTE.
Como psicólogo, trabalho com os CONSCIENTES (geralmente conflitados), de modo a facilitar o emergir da CONSCIÊNCIA INDIVIDUAL. A matéria prima está dada pela natureza humana e não depende, em absoluto, de nenhuma teoria. Não tenho que inventar os potenciais humanos que estão por se atualizar em cada um. O papel é o de facilitador, sendo que ás vezes parece-se com o trabalho do cozinheiro, outras vezes se assemelha ao do agricultor ...
Exemplificando: podemos encontrar o CONSCIENTE (de alguém) com pontos de vista predominantemente pessimistas ou, vice-versa, otimistas. Mas estes sempre se traduzirão por uma rigidez unilateral e pela defesa intransigente dos seus pontos de vista preferidos.

(O que não se vê é o funcionamento do CONSCIENTE livre de PARTIDARISMOS, OPINIÕES FECHADAS E PRECONCEITOS!!!).

A ativação da nossa CONSCIÊNCIA pode nos levar a COMPREENDER a existência real dos PARES DE OPOSTOS - ativos e funcionais em nossa natureza (tanto consciente quanto inconsciente). Também pode nos fazer participar (de modo, cada vez mais, inteligente) do processo automático e dominante de polarização do CONSCIENTE, que sempre faz o pêndulo fixar-se em uma das facetas da realidade, aparentemente, para “simplificar” as coisas e aumentar nossa sensação de segurança mal construída.
O pessimista terá que incorporar valores da polaridade oposta, o mesmo se passando com o otimista.
O movimento do CONSCIENTE, quando existe, já é uma evolução, pois normalmente o CONSCIENTE só consegue se manter funcional, na dependência de uma ESTRUTURA RIGIDA, que evita a oscilação pendular e natural (entre as polaridades psíquicas).
A CONSCIÊNCIA, sim, decide, pois tanto pode AGIR - em uma situação dada - e/ou ficar PASSIVA, pois a CONSCIÊNCIA é bem mais o poder de decisão, o poder de fazer escolhas e o arbítrio pessoal.
Todos podemos conhecer pessoas predominantemente REVOLTADAS assim como as viciadas no CONFORMISMO... Em ambas, o excesso e a especialização (do plano CONSCIENTE) impedem o real desenvolvimento de uma CONSCIÊNCIA dos motivos reais de seus conflitos.
Para a CONSCIÊNCIA não existe CONFLITO (nem oposição conflitiva) entre Potência ou Impotência; Conformismo ou Revolta; Estabilização ou Transformação; Vida e Morte... Sendo todos estes “aspectos” considerados como partes do viver e do existir pessoal e da humanidade em geral.

O CONSCIENTE adora uma explicação e um julgamento enquanto que a CONSCIÊNCIA encontra maior prazer em compreender e em encontrar um sentido e um valor para o vivido.

A CONSCIÊNCIA, ao funcionar, põe na balança os pontos de vista otimistas e/ou pessimistas, ambos reais e palpáveis, ambos entendidos (e considerados) como alternativas reais da natureza humana (e, portanto, do EU) e então delibera sobre qual é o melhor caminho a seguir.

Para a CONSCIÊNCIA o que importa é descobrir o caminho mais sábio.

A CONSCIÊNCIA é fluída, imprevisível e, muitas vezes, impessoal.
É a divina capacidade de decisão, para o momento, na busca do SENTIDO e do VALOR (dos atos), mais do que a busca de coerência e repetitividade.
Ela se ocupa mais com a produção do que com a segurança e a manutenção do que está posto... (sonha/imagina/fantasia possibilidades de realização de potenciais humanos).

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