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O TAO DA FÍSICA
Em virtude do
engajamento juvenil de Fritjof Capra, ao
clima de constestação dos anos 60, que
procurava romper os limites e convenções
sociais de então - e que dava aos jovens
um profundo sentimento de coesão e apróximação,
numa identidade revolucionária -, Capra,
assim como vários outros, como os Beatles,
sentiu-se estimulado a estudar e, acima de
tudo, vivenciar formas não ocidentais de
percepção do mundo e de resgatar os
valores e culturas de povos ou etnias
consideradas por nossa arrogância como exóticas
ou "inferiores" aos do ocidente
industrial. Daí seus profundos estudos
sobre a filosofia oriental e das tradições
culturais xamânicas e indígenas de
outras culturas não ocidentais. Tudo
isso, toda essa aproximação com o
diferente, porém, feita sem negligenciar,
por um só momento, das tradições e do
desenvolvimeto intelectual do ocidente,
naquilo que ele tem de melhor. Por isso,
Capra se encontrava e trabalhava com nomes
como Werner Heisenberg, Geoffrey Chew,
Stanislav Grof, Gergory Bateson que
compartilhavam igualmente de grande
interesse por estas culturas, assim como
Allan Watts, Carlos Castañeda, e tantos
outros. Nunca abandonou suas pesquisas em
Física de alta energia e relizou várias
delas em universidades como as de Paris,
Santa Cruz, Imperial College de Londres e
Berkeley. Além disso, ele começou a
experienciar algumas abordagens orientais
de meditação e exercícios tais como o
T'ai Chi Ch'uan e a Yoga, a conhecer o
pensamento de filósofos orientais
contemporâneos, como Krishnamurti, bem
como participar de alguns grupos de
encontro naquilo que se chamaria de
Psicologia Humanista e em debates sobre
Ecologia com pessoas que buscavam
experienciar formas alternativas de convivência,
de sentir e compartilhar com outros,
vivenciando mais plenamente o contato
interpessoal, num aspecto que era típico
da segunda metade dos anos 60, e que tão
forte participação tivera nos movimentos
políticos de então.
Em um verão de 1969,
Capra estava sentado em frente ao mar,
numa praia da Califórnia, observando as
ondas e refletindo sobre os vários
movimentos rítmicos da natureza: as
ondas, as batidas do coração e o rítmo
da respiração associando-os ao que ele
sabia, intelectualmente, sobre a
"estrutura" física da matéria,
que é composta de moléculas e átomos em
constante vibração... Bom, a união
disso tudo, somado aos seus estudos e vivências
de tantos anos em Física, juntamente com
a visão paradisíaca da praia em que
estava, acabou por estimular em Capra,
subtamente, aquilo que os piscólogos
transpessoais, especialmente Abraham
Maslow, chamam de "peak experiences",
ou experiências culminantes, que são
"estalos" intuitivos, ou, como
falam os americanos, "insights"
de súbita compreensão intuitiva sobre
algo que se percebe e que está,
frequentemente, além do nível
convencional de racionalização linear...
Segundo as palavras do próprio Capra:
"Neste momento,
subitamente, apercebi-me intensamente do
ambiente que me cercava: este se afigurava
a mim como se participasse, em seus vários
níveis rítimicos, de uma gigantesca dança
cósmica. Eu sabia, como físico, que a
areia, as rochas, a água e o ar ao meu
redor eram constituídos de moléculas e
átomos em vibração constante (...).
Tudo isso me era familiar em razão de
minha pesquisa com a Física de alta
energia; mas até aquele momento, porém,
tudo isso me chegara apenas através de gráficos,
diagramas e teorias matemáticas. Mas,
sentando na praia, senti que minhas experiências
anteriores subtamente adquiriam vida.
Assim, eu "vi" (...) pulsações
rítmicas em que partículas eram criadas
e destruídas (...) Nesse momento
compreendi que tudo isso se tratava
daquilo que os hindus, simbolicamente,
chamam de A Dança de Shiva (...)".
"Eu passara por um
longo treinamento em Física teórica e
pesquisara durante vários anos. Ao mesmo
tempo, tornara-me interessado no
misticismo oriental e começara a ver
paralelos entre este e a Física moderna.
Sentia-me particularmente atraído pelos
desconcertantes aspectos do Zen que me
lembravam os enigmas da Física Quântica
(...)
Fritjof Capra in O Tao
da Física (com adaptações minhas), Prefácio.
Hoje em dia, 30 anos
depois desta experiência, os paralelos
entre ciência moderna - a grande semelhança
na forma de ver e entender o mundo que advém
da exploração da física subatômica, em
especial a Mecânica Quântica, e da
Teoria da Relatividade de Einstein - e as
várias tradições místicas, quer do
oriente, quer do ocidente, já é questão
muito debatida e quase lugar comum e é
reconhecida por inúmeras pessoas,
especialmente em cientistas e escritores
como Mário Schenberg, David Bohm, B. D.
Josephson, Pierre Weil, Stanislav Grof e
muitos outros. O próprio Carl Sagan,
geralmente tão cético e explicitamente
arredio a estes assuntos, em sua obra
prima, Cosmos, se detém, em um de seus
capítulos, entre estes paralelos. Mas,
antes de Capra, poucas pessoas haviam
percebido estes paralelos, ainda que entre
os poucos se encontrassem nomes de peso
como Niles Bohr e Werner Heisenberg. Capra
sabia disso, e, por causa desta experiência
por que passara em 69, ele se decidiu - na
verdade, se arriscou - a escrever um livro
que demonstrasse esses extraordinários
paralelos. Foi daí que nasceu, em 1975,
seu best seller O Tao da Física que
mostrou a milhões de pessoas a realidade
destes paralelos e deixou claro que, por
mais sofisticados que sejam nossas descrições
e modelos sobre a realidade, estes serão
apenas construtos e mapas de nossa
compreensão mental sobre o mundo.
Convém, no entanto,
desde já, expor aqui algo que, numa
avaliação superfial de muitos - às
vezes, com uma adicional dose de polêmica
e má fé-, é freqüetemente imputado à
Capra:
A Ciência ocidental
moderna não é inferior e nem está,
grosso modo, simplesmente redescobrindo ou
endossando a sabedoria antiga. Ela
simplesmente está, por seu próprio método
racional e analítico, chegando a um ponto
em que suas teorias passarm a refletir uma
realidade física que tem muito em comum
com a forma de como o místico (o autêntico
místico dedicado ao seu desenvolvimento
espiritual e do próximo, sem querer impor
sua forma de vida e nem comercializá-la
como muitos pseudo-místicos de nossos
dias) descreve o mundo quando experiencia
seus estados alterados de consciência.
Por isso não faz sentido se abraçar,
como alguns dizem, por conta dos
extraordinário paralelos existentes sobre
a percepção de mundo do físico e do místico,
o método do místico para enriquecer a ciência
ocidental ou para proporcionar uma síntese
entre ambas as abordagens. A mistura
dessas duas abordagens seria um erro
tremendo, pois teriamos uma massa informe,
e não aspectos complementares de se
entender a realidade. Capra nunca falou
isso, muito pelo contrário. Eis o que ele
escreve em O Tao da Física:
"(...) Considero a
ciência e o misticismo como manifestações
complementares da mente humana, de suas
faculdades intelectuais e intuitivas. O físico
moderno experimenta o mundo através de
uma extrema especialização da mente
racional; o místico, através de uma
extrema especialização de sua mente
intuitiva. As duas abordagens são
inteiramente diferentes e envolvem muito
mais que uma determinada visão de mundo físico.
Entrentanto, são complementares, como
aprendemos a dizer em Física. Nenhuma
pode ser realmente compreendida sem a
outra; nenhuma pode ser reduzida à outra.
Ambas são necessárias, suplementando-se
mutuamente para uma compreensão mais
abrangente do mundo. Parafraseando um
antigo provérbio chinês, os místicos
compreendem as raízes do Tao mas não os
seus ramos; os cientistas compreendem seus
ramos, mas não as suas raízes. A ciência
não necessita do misticismo e este não
necessita daquela; o homem, contudo,
necessita de ambos. A experiência
profunda da mística é necessária para a
compreensão da natureza mais profunda das
coisas, e a ciência é essencial para a
vida moderna. Necessitamos, na verdade, não
de uma síntese, mas de uma interação
dinâmica entre intuição mística e a análise
científica" (1995, p. 228).
Convém dizer que esta
mesma idéia é tanto adotada por
cientistas, como Grof (1988), LeShan
(1993), Goswami (1998) quanto por teólogos,
como Leonardo Boff (1994) e Frei Betto
(Boff & Betto, 1995) e místicos (Satya
Sai Baba), por exemplo. Aliás, já
Einstein dizia que "Ciência sem
religião é cega; religião sem ciência
é paralítica"... Por isso, é bom
ter cuidado com as exaltações ou
radicalismos de ambos os lados, tanto da
ciência extremamente mecanicista, quanto
a de pseudo-místicos que pipocam à torto
e a direito por todas as partes... O que
se pretende é se erigir pontes para a
troca interdisciplinar de conhecimentos e
se chegar a um entendimento o mais
abrangente e unitivo possível de nossa
realidade, não uma mistura inconsequente
de disciplinas.
O grande sucesso, porém,
alcançado por O Tao da Física e o
contato com várias pessoas em palestras e
aulas, levaram Capra a perceber uma sutil
realidade: não era a relação descritiva
dos avanços da ciência, em si, e nem a
descrição dos insights dos místicos que
mais tocavam as pessoas ao lerem O Tao da
Física, era um algo mais : "o
reconhecimento das semelhanças entre a física
moderna e o misticismo oriental faz parte
de um movimento muito maior, de uma mudança
fundamental de visões de mundo, ou
paradigmas, na ciência e na sociedade,
que agora estão se manifestando por toda
a Europa e América, e que implica uma
profunda transformação cultural. Esta
transformação, esta profunda mudança de
consciência, é o que as pessoas sentiram
intuitivamente nas últimas duas ou três
décadas, e é por isso que O Tao da Física
tangeu uma corda tão sensível" (Capra,
1995, p. 241).
Autor: Carlos Antonio
Fragoso Guimarães. Artigo
retirado da pagina: http://www.geocities.com/Vienna/2809/espiritual.html
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